sábado, 8 de outubro de 2011

Epitáfio de veludo

As lágrimas estão cansadas. Não conseguem mais trilhar o caminho dos olhos. Foram tantas idas e vindas que a árida estrada ressecou a vontade. Suas rachaduras são visíveis a cada centímetro de pretensão. O sol de cada dia petrificou a emoção que insensível e fria agora luta para permanecer sempre da mesma cor: cor de azeviche. E como tal permanece sólida e pétrea à procura de seu subsolo preferido para se conter. Não há mais por que chorar, se não mais lágrimas nem emoção são combustíveis para a dor. Só há o que queimar, para que, em coerência com o deserto meu de cada dia, eu me desfaça em cinzas.






Augusto. F. Guerra

Torniquete


A música ainda é a mesma
O coração parece que parou no tempo
Os acordes do passado
Ainda ecoam no mar revolto
Que acorda a tempestade
À vibração de cada nota



E eu que pensei que o tempo rei
Tudo apagasse, cicatrizasse...
Cada olhar, cada mecha de cabelo
Cada centímetro da pele dela
Ainda está em cada sinapse
Do meu cérebro

Toda noite a mesma imagem
Como num deserto, a miragem
Se desfaz
Ao raiar do sol a cama está vazia
Uma densa neblina acompanha
Meus pensamentos durante o dia
E quando a névoa se desfaz
Continuo naquele ônibus
Escuro, frio e solitário
Ouvindo a mesma música
E mergulhando de cabeça
Na mesma realidade sem cores




Augusto F. Guerra

terça-feira, 15 de março de 2011

Resiliência


Construí minha ponte firme e forte
Certo da engenharia de minhas emoções

Na vaidade de minha inocência,
Alardeei em vão meu feito à multidão

Pobre diabo!
No primeiro vento foram-se
As pilastras de sustentação
E meu sonho imergiu nas águas do esquecimento

Os ecos da multidão me diziam o que eu já sabia;
O que minha razão sufocada tentou
Por vezes me dizer

Mas, firme, e certo de que cada fim
É um novo começo
Nado agora em busca da terceira margem do meu rio
Onde recomeçarei impetuosamente tudo outra vez


Augusto F. Guerra

Um passo em falso

Andava pela cidade das estrelas
Cego pelo esplendor das luzes
Quando uma pequenina estrela
Frágil e bela como a divindade
Pediu-me que alçasse vôo com ela
Encantado pela sua beleza, e
Iludido pelo travesso coração
Respondi que sim
Assim seguimos rumo ao universo

Na minha ansiedade em busca de um sol
Esqueci da minha condição de humano
E assim foi
Primeiro o frio
Depois o ar rarefeito
Mais adiante o oxigênio cessou
E meu corpo caiu como uma estrela cadente
No vazio do meu mundo

Augusto F. Guerra